Colaboração para o site da revista Veja, publicada em janeiro de 2012. Texto na íntegra neste link. Abaixo, íntegra dos fragmentos escritos por mim.
Nova Friburgo – Quem sentiu na pele os efeitos da chuva mais violenta de que se tem notícia no Brasil não consegue ter paz. Quando a chuva cai em Nova Friburgo, a pedagoga Neuza Lúcia Silva não consegue dormir. No início da primeira semana do ano, Neuza passou as noites monitorando a situação do bairro Duas Pedras, onde mora, e que foi fortemente atingido pela tragédia de janeiro de 2011. A nova temporada de chuvas veio acompanhada da inauguração de um sistema de sirenes – que não funcionou. Neuza não ouviu o alarme, mas foi avisada por um vizinho da necessidade de sair de casa. É essa a rede que funciona de verdade. Os vizinhos fizeram um pacto: se algo de grave acontecer, uma família chama a outra e todos fogem juntos para a parte mais alta da localidade. “Agora eu tenho um ‘kit de guerra’ no carro, com água, biscoito salgado e doce, documentos e uma muda de roupa”, afirma.
Petrópolis – Após perder tudo na tragédia que arrasou o Vale do Cuiabá, a dona de casa Antoniele Costa conta com a ajuda do aluguel social. O terreno onde antes havia o imóvel de dois andares da família está vazio. O anexo na parte de cima havia sido construído há pouco tempo para Antoniele morar com o marido e a filha Clarice, que nasceu em dezembro de 2010 – pouco mais de um mês antes de o lar da família ser destruído pela chuva. A força da água foi tamanha que a casa foi carregada por cerca de 8 metros, até bater no prédio vizinho, onde a família buscou abrigo. Antoniele não quer mais erguer um imóvel no local. “Nosso terreno está lá, mas não serve para nada. Não vamos mais construir na beira do rio”, afirma. A dona de casa vive na expectativa de receber uma indenização pelo terreno ou as chaves de uma casa popular, para poder retomar sua vida.
Marcas – Em Teresópolis, a manicure Juliana Xavier esperou 11 meses para conseguir a assinatura do atestado de óbito de 8 familiares que morreram nos bairros Campo Grande, Posse e Santa Rita e não tiveram seus corpos encontrados. No total, ela perdeu 17 parentes e 23 amigos, mas nenhum bem material. Seu maior desejo é não conviver com este sofrimento novamente. “Em todas as pessoas vemos um sofrimento muito grande, e mesmo sem conhecer sofremos com elas”, diz. Já a friburguense Neuza não quer presenciar novamente as imagens do dia seguinte à tragédia. “O que mais choca é ver os restos de uma família no chão: o caderno de uma criança, uma camisa no cabide, um utensílio de cozinha”, relembra.