Entre fantasmas e divas

Matéria publicada em 2010 no caderno Focas do jornal O Estado de S. Paulo, como trabalho de conclusão do Curso Intensivo de Jornalismo Aplicado. Texto na íntegra abaixo.

De acesso restrito, antigos túneis guardam lendas e capítulos da história de São Paulo

Na década de 1950, o túnel subterrâneo que liga o Hospital das Clínicas (HC) ao Instituto de Verificação de Óbitos, em Cerqueira César, provocava medo nos enfermeiros. Encarregados de levar os mortos para exames no prédio ao lado, eles viam as luzes se apagarem de repente e ouviam vozes. Só que nada disso era obra do sobrenatural: Manuel Fabiano, coordenador de Engenharia de Manutenção do HC, passou 58 dos seus 82 anos no hospital e fazia a brincadeira para assustar os colegas.

Construído nos anos 1940, o túnel ainda é usado pelos funcionários. O atendente de enfermagem Sebastião Donizetti, há 31 anos no hospital, lembra que ficou temeroso ao entrar ali pela primeira vez. Agora circula por lá duas vezes por semana, para verificar as lâmpadas e a limpeza do espaço. “Se existe fantasma, ele tem medo de mim.”

Entre Fantasmas e Divas Pag

Em outras regiões da capital, passagens semelhantes contam mais capítulos da história de São Paulo. Abaixo do prédio das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota), por exemplo, uma rede de caminhos foi aberta no fim do século 19 para levar criminosos para quartéis vizinhos. Trechos tiveram de ser destruídos pela dificuldade de conservação ou para construir o metrô e prédios.

A parte que ainda existe virou uma espécie de memorial da Rota. Os tijolos originais, trazidos da Itália, foram conservados, assim como a antiga estrutura das celas e peças de época. É possível visitar o túnel com agendamento prévio – informações pelo telefone 11-3327-7062.

O Roteiro Cultural da Polícia Militar do Estado de São Paulo prevê também a ida a outros quartéis e espaços culturais, como a Pinacoteca e o Museu da Polícia Militar. A cada sábado, é organiza da uma visita gratuita diferente, que inclui um ou dois quartéis e um centro cultural.

Lendas.

No Mosteiro de São Bento, no centro, existe um subsolo com uma área de trabalho e arquivos do Colégio de São Bento. O local é ligado a alguns cômodos e ao jardim do prédio do início do século 20, mas muitas histórias falam de trilhas que levariam a outras igrejas e a lugares estratégicos da região central. A assessoria de imprensa do mosteiro sabe da existência das histórias, mas afirma que não passam de lendas.

Muita imaginação também ronda o Teatro Municipal. Dizem que túneis teriam sido feitos até hotéis do entorno, para permitir que artistas entrassem e saíssem sem ter contato com o público. A arquiteta do Departamento de Patrimônio Histórico da Prefeitura, Rafaela Calil, porém, garante que as passagens levam apenas até a Praça Ramos e são usadas para ventilação. Mas podem de fato ter servido de caminho para divas de outros tempos. “Não há comprovação, mas pode ser que elas saíssem de algum hotel na região, fossem até o túnel e entrassem por ali”, diz Rafaela.  Se for verdade, assim como as divas, os túneis da cidade ainda mexem com a imaginação e despistam os curiosos.

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